Acabaram com a USP, mas não comigo.

Pois é, meu caro que me lê agora, isso é a mais triste verdade de uma instituição que existe desde 1934, e algumas de suas unidades existem desde o século retrasado. Local por onde passaram figuras ilustres de nossa política, artes, cultura, empresariado, cinema ... e que devem estar tão estarrecidos quanto eu pelo lento e gradual processo de degradação que corroe a mesma.
Um local destinado a formação de cidadãos de bem, cabeças pensantes e atuantes de nossa sociedade paulista e brasileira - quiçá internacional -, formadores de opinião e transformadores ativos do meio ao redor em que vivemos. Basta ler o estatuto da USP, que você vai ler palavras similares a que citei agora. Palavras válidas para a maioria das universidades boas que você conheça.
Essa deterioração ocorreu por diversas frentes e por motivos diversos.

Pra começar a sociedade cobra demais em diversos aspectos aqueles que, como eu, fazem parte deste universo. Querem que a mudança econômica que acompanha o país esteje em conjunto com o desenvolvimento da universidade, que não é tão rápido quanto a mesma. Enxergam-nos como mão de obra capacitada, que vai aumentar futuramente os lucros de uma empresa, ou gerar outras novas. De fato, desenvolvimento científico e tecnológico está emparelhado com economias fortes e consolidadas. Todas as nações consideradas de primeiro mundo também são, em diversas áreas de pesquisa, as melhores em ramos diversos. Mas que não pensem que a ciência esteje a serviço das indústrias e economia: a Inglaterra pragmatizou esta idéia no começo do século 19, e a consequência foi que outras nações, como Holanda, Alemanha e França ascenderam no mesmo nível dela, em TODOS os níveis. Quase que ela ficou a ver navios.
Neste ponto falo por mim, que trabalha com ciência, mas todos os que realizam trabalhos científicos nas grandes universidades estão obviamente fazendo o mesmo que eu. Ainda que seja em áreas como engenharias e administração, a princípio voltadas para "aplicações" em geral, mas é válido. E os que estudam nelas são pessoas em formação profissional, em nível avançado ou elementar.

O descaso e ceticismo com que autoridades públicas olham para nós também acaba conosco, que fazemos parte destas instituições. A menor quantidade de verbas necessárias para manutenção de pessoal de alta capacitação, reforma de suaa instalações e infra-estruturas, e uso em programas para resultados imediatos visando as comunidades. Ainda de acordo com o que citei no parágrafo anterior, olham as universidades como uma grande empresa a ser gerida, e as suas unidades como divisões de produção específica. Alguém ai tem idéia de como é difícil entrar na USP? Tem idéia do quão difícil é a Fuvest? DOIS anos da minha vida dedicados a entrar nela. E quando entro, me dou conta da situação em que vive a universidade. Até hoje me lembro do meu professor de física, o Thunder (Arnaldo é sua identidade secreta),  falando de quando entrou nela, e sempre repetia a frase: "Você entra nela: prédinhos caídos, velhos, pintura desbotando... mas o nível do pessoal, ó (sinal de positivo com as mãos). Agora vai na unizuzuba (essa era boa!): porta de vidro, chão de mármore, balinha e cafezinho na faixa...legal, né? Pra compensar os caras são tudo burrão, não sabem fazer conta nenhuma, logaritmo é um mistério!" Isso pra não falar das greves e paralisações que tomam conta dela de tempos em tempos, sem comentários.

A gota d'água aconteceu umas duas semanas atrás. Teve um protesto do pessoal da faxina de algumas unidades, e o resultado foi que os banheiros ficaram um nojo completo. Suspenderam as aulas em algumas delas, os próprios alunos tiveram de limpar os banheiros e corredores, fizeram um mutirão. E os funcionários da faxina, em uma total mostra de falta de respeito, quando foram na Física, rasgaram sacos de lixo e espalharam ele pelo banheiro inteiro. A greve ocorreu por problemas burocráticos, a empresa que eles trabalham teve um problema na justiça, e por ordem maior o repasse de dinheiro da USP para ela foi bloqueado por ordem judicial. A USP ja tinha o dinheiro separado para ela, mas nõa podia dar. E os trabalhadores, achando que era coisa da USP, se revoltaram contra ela. Eles tem o direito de reclamar pelo não pagamento, mas que fale isso com a empresa que os contratou, afinal ela é que paga o soldo. Ma o estrago já tinha sido feito, e ficou evidente o que já se sabe: Não respeitam mais a USP.
A gente também (que faz parte da instituição) não sabe dar valor pra ela, boa parte do pessoal tem zero de auto-estima, não sabe onde está circulando, e não se valoriza! Mas enquanto existirem pessoas como eu, que é o principal diferencial dentro dela, que se esforçam e se destacam onde quer que atuem na sociedade, ela não vai acabar!

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